Olhos Verdes
Por Lizzy Angelis.
My Point
of View.
Aquele era um fim de semana conturbado. O que eu estava fazendo no ponto de ônibus em pleno sábado, às nove da manhã? Estava a caminho do evento estudantil mais concorrido do país.
O céu
plenamente azul e o sol forte àquela hora da manhã já indicavam que seria um
lindo dia de calor. E eu estava preparada para passar o dia todo sentada,
respondendo questões num teste que era mais do que um amontoado de perguntas
difíceis: Era uma verdadeira prova de resistência psicológica. Na minha bolsa
uma garrafinha de água congelada e pacotes de bala eram o combustível que eu
precisava para me manter mentalmente inteira naquele longo período de tortura.
Quando o
ônibus chegou, por sinal já estava lotado. Eu e minha irmã – sim, minha irmã
também estava indo fazer o teste – adentramos no veículo com excesso de
pessoas. Por sorte, e após alguns empurrões, nós duas conseguimos passar pela
catraca. Foi ali que tudo aconteceu.
Não que
algo realmente de outro mundo tenha acontecido.
Bem, eu
conversava com minha irmã sobre uma amiga minha que havia viajado e nós dávamos
risada, quando percebi alguém me olhando. E eu olhei para ele. Foi, tipo,
aquele momento cor de rosa, cheio de brilhos e pétalas de cerejeiras dos mangás
shoujo.
Eram
olhos verdes magnéticos, que não me deixavam olhar para outro lugar. Mas, não
eram apenas os olhos que me atraíam. Seu rosto era bonito e anguloso e o
cabelo...
Cachos
castanhos que o emolduravam.
Sabe
aquele momento em que você olha nos olhos de uma pessoa e vê como sua vida
seria ao lado dela? Pois é, foi assim que eu me senti. Como se aqueles olhos
verdes penetrassem em minha mente e me consumissem por inteiro. E, por mais que
eu quisesse, por mais que aquele poder de atração fosse forte, eu não consegui
sustentar o olhar por muito tempo.
Dignei-me
a abaixar a cabeça, envergonhada e continuar a conversa boba com minha irmã.
Mas, intimamente eu rezava para que ele viesse falar comigo, para que ele se
esbarrasse em mim, ou qualquer outra coisa que gerasse um mínimo de contato,
acontecesse. Por que eu não possuía coragem o suficiente para ir até ele.
Treinei mentalmente uma série de situações que eu poderia causar para conseguir
ao menos ouvir sua voz por um ínfimo instante, mas não tive atitude suficiente
para realizá-las.
E lá fui
eu, descer do ônibus ao chegar ao local da prova. No meio da confusão de gente,
acabei perdendo-o de vista, o que me deixou extremamente arrependida.
Após um
longo período de espera, perambulando pelas ruas próximas ao local enquanto os
portões não se abriam, finalmente foi possível entrar no colégio onde seria
realizado o teste. E por mais que meus olhos procurassem, não consegui
distinguir nem um traço daquela presença encantadora que fazia meu coração pular
no peito.
Contentei-me
em seguir para minha sala e sentar-me na cadeira com meu nome. Enquanto as
outras pessoas entravam, preparei meu pequeno espaço, dispondo os sacos de bala
e jujubas sobre a mesa, os pacotes de bolacha e batatinha embaixo da cadeira e
a garrafinha de água no chão.
Mas o meu
dia de encontros especiais não estava nem próximo de chegar ao fim.
Meus
olhos brilharam quando ela entrou na sala. Não como no momento anterior... Era
um brilho de admiração. Admiração e felicidade. Por quê? Por que ela era o
verdadeiro reflexo dos meus ídolos. Cabelo raspado nas laterais. Tatuagens pelo
corpo. Um sobretudo vermelho, – o que me fez admirá-la ainda mais – calça com
estampa do exército e coturnos pretos. Um par de luvas nas mãos e a maquiagem forte
finalizavam o visual mais perfeito que eu já havia visto na vida.
Queria
conter o sorriso quando ela sentou na cadeira ao meu lado. Eu não tinha a menor
noção do que fazer.
Bem, ela
não era uma pessoa famosa, mas me deixava ansiosa e feliz, como se fosse. Era
uma presença completamente diferente da minha e eu sentia como se vivêssemos em
mundos paralelos e tivéssemos nos encontrado por acaso, em uma distorção
espacial.
Minhas
mãos formigavam.
E então,
por um breve momento, eu senti como se esse “mundo paralelo” não existisse. Foi
quando ela me ofereceu uma barrinha de cereal. Eu nunca fui o melhor exemplo de
vida saudável e minha mesa exibia isso perfeitamente. E mesmo assim ela me deu
uma de suas barrinhas de cereal.
Não
dissemos nada. Foi simplesmente ela me oferecer e eu pegar. E a única coisa que
eu consegui proferir foi um “obrigada” em voz baixa.
Não
demorou muito até que a prova começasse. A partir dali, me concentrei apenas em
mim mesma e nos doces ao meu redor. E após quase cinco horas eu consegui
terminar e sair dali.
Do lado
de fora, encontrei com minha irmã e nós fomos para o ponto esperar o ônibus.
E
adivinha quem estava no mesmo ônibus que eu peguei? O rapaz de olhos verdes. E
o que eu fiz? Continuei com minha timidez boba. Olhava-o de segundo em segundo,
desviava o olhar e passava a olhá-lo novamente. E minha guerra interna me fazia
suar, enquanto minha mente formulava mais um milhão de cenas em que eu falava
com ele, ou ele falava comigo.
Ao findar
do trajeto eu desci do ônibus da mesma forma que entrei: sem trocar uma única
palavra com o estranho garoto que causava em mim sensações que nunca havia
experimentado. E dormi me martirizando por ser tão tímida.
No dia
seguinte jurei que, se o encontrasse, falaria com ele. Inventaria uma desculpa,
fingiria que o conhecia de algum lugar. Iria tentar. Mas não aconteceu. Não
pegamos o mesmo ônibus dessa vez. Nem mesmo na volta. Mas eu sei que, se for
para tudo que eu vi, ao encarar seus olhos verdes, acontecer, com certeza irei
encontrá-lo de novo. E quando isso acontecer, não hesitarei. Não vou deixar o
meu futuro escapar pelas minhas mãos uma segunda vez.
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